Por
Robert Reich, no site Carta Maior:
Dick
Kovacevich, ex-CEO do banco Wells Fargo, acha que a maioria dos americanos deve
voltar ao trabalho em abril, incentivando-nos a "gradualmente trazer essas
pessoas de volta e ver o que acontece".
Lloyd
Blankfein, ex-CEO da Goldman Sachs, cujo patrimônio líquido é de US$ 1,1
bilhão, recomenda que "aqueles com menor risco de doenças voltem ao
trabalho" dentro de "bem poucas semanas".
Tom
Galisano, fundador da Paychex, cujo patrimônio líquido é de US$ 2,8 bilhões,
acredita que “os danos de manter a economia fechada podem ser piores do que
perder mais algumas pessoas. Você está escolhendo o melhor entre dois males.”
Donald
Trump está preocupado que um bloqueio prolongado possa prejudicar suas chances
de reeleição.
Ele
concorda: "Não podemos deixar que a cura seja pior que o problema",
disse o presidente na semana passada, anunciando que a América estaria
"aberta aos negócios" até a Páscoa.
Mas
as autoridades de saúde pública, incluindo o Dr. Anthony Fauci, diretor do
Instituto Nacional de Alergia e Doenças Infecciosas, acham que não é hora de
reduzir o distanciamento social.
Muito
ao contrário, dizem eles, a economia precisa ser fechada ainda mais.
Senão,
o vírus continuará aumentando, inundando hospitais e causando muito mais
mortes.
Os
Estados Unidos lideram o mundo em casos de coronavírus. Fauci acredita que
ainda não sentimos o pior da pandemia.
Pode
parecer lógico ponderar a ameaça à saúde pública contra as perdas acumuladas na
economia e, em algum momento, decidir que as perdas econômicas superam os
riscos à saúde.
Como
adverte Stephen Moore, que está assessorando a Casa Branca, "você não pode
ter uma política que diga que salvaremos cada vida humana a qualquer custo, sem
considerar de quantos trilhões de dólares você esteja falando".
Mas
isso deixa de fora uma coisa relevante.
Os
"trilhões de dólares" de perdas econômicas não existem em nenhum
balanço patrimonial que possa ser comparado contra vidas humanas.
Uma
"economia" nada mais é do que seres humanos.
Portanto,
importa saber de quais perdas estamos falando – vidas de quem e dólares de
quem.
"Olha,
você vai perder várias pessoas com a influenza", disse Trump durante
encontro com eleitores na Fox News na terça-feira.
"Mas
você vai perder mais pessoas colocando o país em uma recessão ou depressão
maciça."
Errado.
Recessões e depressões não fazem, elas próprias, as pessoas adoecerem ou
morrerem.
A
saúde delas fica em perigo durante essas crises, se eles não tiverem dinheiro
suficiente para comer, para manter um teto sobre suas cabeças e para receber
cuidados médicos necessários.
Na
semana passada, os legisladores deram um passo importante para evitar tais
dificuldades.
Como
os níveis de seguro-desemprego em muitos estados são extremamente baixos, os
democratas insistiram em uma clausula no projeto de lei de US$ 2,2 trilhões,
para aliviar os efeitos da pandemia de coronavírus, que daria aos americanos
desempregados US$ 600 adicionais por semana durante quatro meses.
Quando
os republicanos se opuseram, argumentado que isso tornaria a renda de alguns
dos desempregados maior do que os seus salários quando trabalhavam, o projeto
quase foi abandonado.
A
votação do Senado da emenda republicana foi de arrepiar 47 a 47. Mas a
disposição entrou na lei.
Aparentemente,
os republicanos não consideraram que o salário do americano típico que trabalha
não aumenta há décadas, ajustado pela inflação.
Portanto,
um aumento temporário nos salários, a fim de levar as pessoas a ficar em casa
e, assim, ajudar a retardar a disseminação do Covid-19, dificilmente pode ser
visto como impróprio.
Aqui
está o que é impróprio.
A
"economia" que os banqueiros e bilionários estão ansiosos para
reiniciar estava crescendo rapidamente.
Mas
a maioria dos ganhos tinha ido para os lucros das empresas, como mostrava a
ascensão meteórica do mercado de ações.
Os
banqueiros e bilionários, que agora incentivam os americanos para voltarem ao
trabalho, possuem uma grande fatia desse mercado de ações. O 1% mais rico da
população possui aproximadamente metade do valor de todas as ações.
(Os 10% mais ricos possuem mais de 80%.)
Portanto,
quando recomendam que os americanos voltem ao trabalho em prol da
"economia", eles estão, na realidade, pedindo que outras pessoas
arrisquem suas vidas por causa dos portfólios de ações dos banqueiros e
bilionários.
Embora
seja verdade que não podemos salvar todas as vidas humanas a qualquer custo, e
que em algum momento teremos que encerrar o confinamento nos Estados Unidos e
aceitar algumas baixas adicionais de coronavírus, precisamos ter em mente de
quem estamos falando.
Os
pesos que os americanos médios, provavelmente, colocarão nas opções voltar ao
trabalho e expor-se ao vírus, serão bem diferentes daqueles que os banqueiros e
bilionários dão, especialmente se os americanos médios tiverem apoio de renda
suficiente para passar pela crise.
Quatro
meses de benefícios extras de desemprego podem não ser suficientes. A nação
mais rica do mundo certamente possui recursos suficientes para manter seu povo
seguro em casa pelo tempo que for necessário.
*
Publicado originalmente em 'The Guardian'. Tradução de César Locatelli.
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