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sexta-feira, 29 de agosto de 2025

Democracia, polarização e reformas: o que diz a The Economist sobre o Brasil!

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Vivemos tempos em que a informação é essencial para entendermos melhor o mundo ao nosso redor. A revista The Economist publicou uma análise sobre o atual cenário político brasileiro e suas implicações internacionais.

Mais do que tomar partido, o importante é estarmos atentos e bem-informados. Essa leitura nos ajuda a refletir sobre democracia, instituições e os desafios que enfrentamos como sociedade.

👉 Confira a reportagem completa a seguir e tire suas próprias conclusões.


IMAGINE UM PAÍS onde um presidente polarizador perdeu sua tentativa de reeleição e se recusou a aceitar o resultado. Ele declarou a votação fraudada e usou as redes sociais para incitar seus apoiadores a se rebelarem. Eles o fizeram aos milhares, atacando prédios do governo. Então, a insurreição fracassou, o ex-presidente enfrentou uma investigação criminal e os promotores o levaram a julgamento por planejar um golpe.

Isso soa como uma fantasia da esquerda americana. Na outra grande democracia do hemisfério, é realidade. Em 2 de setembro, o julgamento de Jair Bolsonaro, ex-presidente do Brasil e o "Trump dos trópicos", começará no Supremo Tribunal Federal. As evidências parecem um flashback do passado turbulento do Brasil. Um ex-general de quatro estrelas conspirou para anular o resultado da eleição; assassinos planejaram assassinar o verdadeiro vencedor. Como nossa investigação sobre a trama explica , o golpe fracassou por incompetência e não por intenção.

 Bolsonaro e seus associados provavelmente serão considerados culpados. Isso torna o Brasil um caso de teste para a recuperação de países de uma febre populista. Na Polônia, dois anos após a saída do partido Lei e Justiça ( P i S ), uma coalizão liderada por Donald Tusk, um centrista, é limitada por um novo presidente do P i S. No Reino Unido, o Brexit agora é impopular, mas Nigel Farage, o político que o inspirou, lidera nas pesquisas. Nem mesmo o massacre do Hamas em 7 de outubro de 2023 conseguiu tirar Israel de suas amargas divisões.

Mas a comparação mais marcante do Brasil é com os Estados Unidos. Os dois países parecem estar trocando de lugar. Os EUA estão se tornando mais corruptos, protecionistas e autoritários — com Donald Trump esta semana mexendo com o Federal Reserve e ameaçando cidades controladas pelos democratas. Em contraste, mesmo com o governo Trump punindo o Brasil por processar Bolsonaro, o próprio país está determinado a salvaguardar e fortalecer sua democracia.

Um dos motivos pelos quais o Brasil promete ser diferente de outros países é que a memória da ditadura ainda está fresca. Ela restaurou a democracia em 1988. O Supremo Tribunal Federal, moldado pela "Constituição Cidadã" promulgada na época, ainda se vê como um baluarte contra o autoritarismo.

Além disso, a maioria dos brasileiros está de olhos abertos sobre o que Bolsonaro fez. A maioria acredita que ele tentou dar um golpe para se manter no poder. Governadores conservadores que disputam a eleição do próximo ano contra o presidente de esquerda, Luiz Inácio Lula da Silva, precisam dos votos dos apoiadores de Bolsonaro para vencer. Mas até eles criticam seu estilo político.

Esse reconhecimento abriu a possibilidade de reformas. Como nosso briefing descreve, a maioria dos políticos brasileiros, tanto de esquerda quanto de direita, quer deixar para trás a loucura de Bolsonaro e sua polarização radical. Dos figurões empresariais em São Paulo aos políticos de Brasília, há um consenso surpreendente sobre uma agenda difícil, mas urgente, de mudança institucional.

Paradoxalmente, uma tarefa fundamental é controlar o Supremo Tribunal Federal, apesar de seu papel como guardião da democracia brasileira. Como árbitro de uma Constituição com 65.000 palavras, o tribunal supervisiona uma gama estonteante de regras, direitos e obrigações, desde política tributária até cultura e esportes. Grupos que vão de sindicatos a partidos políticos podem apresentar casos diretamente. Às vezes, os próprios juízes iniciam processos, incluindo um inquérito sobre ameaças online, alguns deles contra o próprio tribunal — tornando-o vítima, promotor e juiz. Para lidar com uma carga de trabalho de 114.000 decisões somente em 2024, a maioria das decisões vem de juízes individuais. Há amplo reconhecimento de que juízes não eleitos, com tanto poder, podem corroer a política, bem como salvá-la de golpes. Os próprios juízes veem o caso para mudança.

Consertar o tribunal será difícil, mas seu poder é apenas parte da bagagem constitucional que o Brasil carrega. O país também sofre de incontinência fiscal crônica, em particular isenções fiscais descontroladas e aumentos automáticos de gastos. Alguns desses fatores foram consagrados na Constituição de 1988 para coibir líderes autoritários em potencial. Outros são culpa do Congresso brasileiro, que assumiu o controle do orçamento federal e usa sua influência para financiar projetos pessoais. O efeito é a exclusão de investimentos e o enfraquecimento do crescimento.

Em teoria, isso aponta para um caminho a seguir. Bolsonaro deve ser julgado por seus crimes e punido se for considerado culpado. No ano que vem, a eleição deve ser disputada em torno das reformas mais amplas.

Na prática, nada disso será fácil. Um obstáculo é o Sr. Trump. Ele acusou o Supremo Tribunal Federal (STF) de uma "caça às bruxas" contra seu amigo e, no início de agosto, impôs tarifas de 50% sobre produtos brasileiros. O governo também impôs sanções Magnitsky — uma exclusão do sistema financeiro americano geralmente destinada a violadores de direitos humanos e cleptocratas — a Alexandre de Moraes, o juiz que lidera o caso Bolsonaro. Outras autoridades e políticos podem seguir o exemplo. Isso nos remete a uma era sombria e passada, em que os Estados Unidos habitualmente desestabilizavam os países latino-americanos.

Felizmente, a interferência do Sr. Trump provavelmente sairá pela culatra. Apenas 13% das exportações brasileiras vão para os Estados Unidos, e consistem principalmente de commodities, para as quais novos mercados podem ser encontrados. Os EUA já concederam inúmeras isenções. Até agora, os ataques do Sr. Trump apenas fortaleceram a posição de Lula nas pesquisas de opinião e lhe deram uma desculpa para qualquer notícia econômica ruim antes da próxima eleição, em outubro de 2026.

Os obstáculos internos à reforma são maiores. Mesmo que as elites queiram mudanças, o Brasil ainda é um país profundamente dividido. Bolsonaro tem apoiadores fanáticos que causarão problemas, especialmente se o tribunal impor uma sentença severa. Reformar o Supremo Tribunal Federal e a Constituição exige que grupos abram mão do poder em prol do bem comum. É natural que se apeguem ao que têm — mesmo que seja apenas porque não confiam em seus inimigos. Todos querem crescimento, mas, para obter mais crescimento, algumas pessoas terão que abrir mão de alguns privilégios.

As tensões serão, portanto, inevitáveis. Mas, ao contrário de seus pares nos Estados Unidos, muitos dos políticos tradicionais do Brasil, de todos os partidos, querem seguir as regras e progredir por meio de reformas. Essas são as marcas da maturidade política. Pelo menos temporariamente, o papel do adulto democrático do hemisfério ocidental se deslocou para o sul. 


Capa traz Bolsonaro como "Viking do Capitólio", pintado com as cores do Brasil. A ilustração faz alusão a Jacob Chansley, homem que virou símbolo da invasão ao Congresso americano, em 6 de janeiro de 2021, por apoiadores inconformados com a derrota de Donald Trump para Joe Biden nas eleições de 2020.

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