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quinta-feira, 16 de abril de 2020

Fez-se fundamental por seus livros, não pelo marketing - O Globo16 Abril 2020 - BOLÍVAR TORRES E NELSON VASCONCELOS segundocaderno@oglobo.com.br


Fez-se fundamental por seus livros, não pelo marketing

Poucas estreias literárias foram tão impactantes quanto a de Rubem Fonseca. Primeiro livro de contos de um ex-delegado de polícia que ninguém conhecia, “Os prisioneiros” foi saudado como “a revelação do ano” pelo “Jornal do Brasil”. Naquele 1963, ninguém escrevia como ele. “Uma língua nova”, como definia o crítico Wilson Martins, que se afastava do horizonte modernista e revelava um outro Brasil, urbano, cosmopolita e, principalmente, doente em suas metamorfoses.
Reinventando a literatura policial (e a literatura brasileira como um todo), Fonseca colocou a cidade no centro de suas narrativas, consolidando-se como um observador da violência urbana e da miséria humana. Para o crítico Alfredo Bosi, o autor inaugurou uma corrente “brutalista” no país.
Nascido em 1925, em Juiz de Fora (Minas Gerais), Fonseca se mudou para o Rio ainda na infância. No início dos anos 1950, tornou-se comissário em um Distrito Policial do bairro de São Cristovão. Embora fosse essencialmente um funcionário de gabinete e não frequentasse a rua, a vivência na polícia foi matéria prima essencial para as suas primeiras narrativas.
Em 1975, lançou “Feliz ano novo”, um best-seller instantâneo que chegou a ser proibido pela ditadura militar. Reconhecido como um dos melhores contistas da história da literatura brasileira, Fonseca também deixou romances marcantes. O histórico “Agosto” (1990), que tem o suicídio de Getúlio Vargas como pano de fundo, é um dos seus maiores sucessos.

INFLUÊNCIA EM GERAÇÕES
Para muitos, ele foi o responsável por trazer uma mentalidade urbana para a literatura brasileira. Embora tenha iniciado a carreira nos anos 1960, sua obra continuava sendo uma influência maior para autores contemporâneos.
Paralelamente ao sucesso comercial, Fonseca colecionou prêmios, culminando com o Camões, o mais importante da língua portuguesa, em 2003. Também ganhou nada menos do que seis Jabutis (1969, 1983, 1996, 2002, 2003, 2014) em diferentes categorias (romance e contos). E recebeu um Prêmio Machado de Assis da Biblioteca Nacional pelo conjunto da obra, em 2014.
Fonseca era um dos escritores brasileiros mais conhecidos e traduzidos no exterior. O reconhecimento na América Latina era enorme, com admiradores como o premiado escritor salvadorenho Horacio Moya (autor de “Asco”).
Tinha também uma cultura geral impressionante, sempre surpreendendo seus interlocutores. Cinema e música eram assuntos frequentes, além, claro, de literatura. Era imbatível quando falava de autores de todos os lados do mundo. Outro grande escritor, João Antônio (1937-1996), certa vez comentou, bem ao seu estilo, sobre suas conversas com o amigo:
— O Zé Rubem me deixa desconcertado. Vá saber de literatura assim lá em caixa prego.
O escritor continuou com uma produção ativa no fim da vida, ainda que menos celebrada pela crítica. Tanto que publicou cinco livros de contos nos últimos dez anos, que dividiram opiniões. São eles: “Axilas e outras histórias indecorosas” (2011), “Amálgama” (2013), “Histórias curtas” (2015), “Calibre 22” (2017), e “Carne crua” (2018), sua obra derradeira.
Rubem Fonseca não concedia entrevistas longas há mais de 50 anos. Muito antes do isolamento social causado pelo surto de Covid-19, a reclusão do autor se tornou folclórica na cena literária e também na cultura popular. Virou um personagem no imaginário do Rio. Não que fosse grosseiro. Simplesmente desconversava e se esquivava, provocando ainda mais a insistência (ou chatice) dos fãs, que não eram poucos.
Ficou famoso o episódio em que, testemunhando in loco o momento histórico da queda do Muro de Berlim (1989), um repórter brasileiro o entrevistou para a TV, sem saber de quem se tratava. Em vez de tirar onda, identificou-se apenas como “José Rubem”, não mais que isso.
Fez-se fundamental por seus livros, não por seu marketing. 
Não fugia das câmeras por timidez ou falta de vaidade. Pelo contrário, era bastante consciente do seu papel na literatura, tinha orgulho da sua obra.
Segundo a sua filha, Bia Corrêa do Lago, a presença limitada na mídia lhe permitia circular mais à vontade pelas ruas do Leblon.
— Para ele, o escritor tem que observar, não ser observado —disse ela em uma entrevista de 2015, quando o pai completou 90 anos.

Os livros essenciais e as adaptações

“Os prisioneiros”
Ao ser publicado, em 1963, recebeu elogios do crítico Wilson Martins, que saudou a estreia de Fonseca e afirmou que o escritor trazia “a literatura no sangue”. Os 11 contos do apresentaram o estilo brutal de Fonseca ao leitor.

“Lúcia McCartney” Publicado em 1967, é seu livro mais experimental. O conto que lhe dá nome deu origem ao longa “Lúcia McCartney, uma garota de programa” (1971), e foi adaptado para uma série homônima de 2016, do GNT, dirigida por José Henrique Fonseca, um de seus filhos.

“O caso Morel”
O primeiro romance, de 1973, é centrado em Paulo Morel, artista preso por assassinato. Ele pede ao escritor Vilela (que já havia aparecido em “A coleira do cão”, de 1965), ajuda para escrever uma história que não se sabe se é real ou não.

“Feliz ano novo” 
Publicado em 1975 e censurado pela ditadura após três edições esgotadas, reafirmou o lugar de Fonseca na literatura ao apresentar 14 narrativas brutais, cheias de sexo, violência e conflitos de classes.

“O cobrador”
Publicado em 1979, traz alguns de seus contos mais conhecidos , como o que dá título à obra, “Livro de ocorrências” e “O jogo do morto”. Em 2006, foi adaptado em coprodução internacional dirigida por Paul Leduc.

“A grande arte”
O romance de 1983 é protagonizado por Mandrake, advogado que se tornou um dos personagens mais conhecidos do autor, que tenta desvendar o assassinato de uma prostituta. Deu origem ao longa homônimo, de 1991, de Walter Salles.

“Bufo & Spallanzani”
O romance de 1986 acompanha o detetive Guedes, que se vê diante de um caso que abalou o high society carioca. O livro foi adaptado para o cinema em 2001 por Flávio R. Tambellini, em colaboração com a escritora Patrícia Melo.

“Agosto”
O romance de 1990 mescla fatos históricos e fictícios sobre a crise política de 1954, que culminou com o suicídio de Getúlio Vargas. Em 1993, virou minissérie da TV Globo, com José Mayer, Vera Fischer e Tony Tornado no elenco.

terça-feira, 26 de dezembro de 2017

Por que ler Clarice Lispector? Em dezembro, completam-se 40 anos do falecimento da escritora brasileira e da publicação de uma de suas principais obras.


Por que ler Clarice Lispector?

Em dezembro, completou 40 anos do falecimento da escritora brasileira e da publicação de uma de suas principais obras.(10-12-1920 - 09-12-1977)

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Quando o assunto é a escritora, o que não faltam são leitores apaixonados para falar da sua obra. A estudante de jornalismo Heloísa Iaconis é exemplo disso. Ela conta que admira muitas escritoras, cantoras e artistas do cenário cultural brasileiro. Mas Clarice, é certo, está entre as autoras preferidas. A paixão vem de cedo. Heloísa conheceu a escritora com 11 anos, quando estava na quinta série e leu A hora da estrela, uma das principais obras da autora.
"Eu leio Clarice porque, através dos textos dela, das histórias que ela criou, eu consigo manter viva a minha inquietude, que acho que é um pilar essencial da vida. Através das palavras dela, eu consigo deixar que pulse a minha capacidade de me indignar diante de muitas coisas, sejam sociais, políticas, de espírito ou psicológicas", conta.
Em dezembro de 2017, completam-se 40 anos da morte de Clarice e, também, da publicação de A hora da estrela. Ela nasceu na Ucrânia em 1920, época da Revolução Bolchevique, mas naturalizou-se brasileira. Para fugir da perseguição aos judeus, sua família se mudou para Recife ainda em seus primeiros anos. Escritora e jornalista, escreveu contos, romances, crônicas e obras infantis.
Mas, há quem acredite que ler Clarice não é uma tarefa fácil. Para a professora e doutora em literatura pela Unicamp Emília Amaral, grande parte disso se deve ao fato de a escritora desafiar o seu leitor.
"A dificuldade em ler Clarice vem da nossa dificuldade em pegar um romance, ou um livro de contos, e não achar logo o enredo. O traço estilístico básico de um romance é que ele vai contar uma história, e o leitor pega o romance esperando essa história. O estilo de Clarice é nos aquecer junto com ela para entrar na história. A gente entra com ela em um processo de metalinguagem de ir parindo a história, e o leitor faz parte disso", explica a professora.
Mulher e judia em uma época na qual a participação feminina na literatura ainda era pouco discutida, Clarice foi uma escritora muito mistificada. Ainda na década de 1960, ela encontrou dificuldade para publicar seus textos. Na época, estava em evidência o chamado "realismo socialista". Autores como Graciliano Ramos e João Guimarães Rosa ganhavam palco ao falar da realidade do povo brasileiro. Mas Clarice, como conta Emília, não se encaixava nessa demanda do mercado. "Está todo mundo pensando na realidade social, na seca, no sertanejo, e a Clarice está falando de dentro da nossa alma."

Aqueles que se dão a chance de conhecer a obra da escritora terão experiências diferentes das que têm com qualquer outro autor, explica a professora. "Ler Clarice, como ler qualquer boa literatura, é transformar a vida. É poder viver a partir da nossa vidinha única muitas outras vidas e descobrir muitas outras coisas que nos ampliam a humanidade. Ler Clarice, particularmente, é se conhecer melhor. É pagar o ingresso de ir mais fundo, de deixar de lado a superficialidade do cotidiano e tentar ir mais fundo naquilo que nós somos, queremos, dos nossos sonhos, contradições etc."
Para aqueles que ainda não entraram no mundo clariciano, a professora deixa uma dica: "Sugiro um livro de contos, especialmente Felicidade Clandestina e também Laços de Família, que são contos com enredos leves, curtos e absolutamente adoráveis. Você não consegue parar." 
Emília escreveu, recentemente, a obra Para amar Clarice. O livro traz uma análise das obras da escritora, na tentativa de desmistificar suas histórias para que todos possam ser capazes de entender seus personagens. Uma boa chamada para aqueles já leem a autora e os que querem dar uma chance para conhecê-la.  Edição: Anelize Moreira
                                                                            Reprodução do site: Brasil de Fato

segunda-feira, 28 de maio de 2012