Foto da Escola João Beraldo-2020-momento de formação entre os professores
A reinvenção do professor em tempos de coronavírus
Entenda que a pandemia está funcionando como um acelerador de mudanças e antecipador de novos cenários. Não acredita? Tendências que levariam meses, talvez anos, para acontecer, estão chegando sob pressão.
Querida professora,
querido professor:
Cá está
você, de novo, no meio de mais um tiroteio histórico, sem saber bem nem como e
nem por quê. Ninguém lhe consultou sobre fechar escolas, promover aprendizados
a distância, férias ou calendários escolares. Você e as crianças, os
verdadeiros sujeitos da educação, sentem-se um tanto quanto desamparados e
desorientados. E não é pra menos! Vivemos o tempo do “re”: repensar, refazer,
ressignificar, reconstruir, remodelar. E agora venho eu para lhe complicar um
pouco mais ainda: é hora de se REINVENTAR. E digo mais, é de fundamental
importância.
Permita-me
colaborar no seu processo de reinvenção com algumas ideias. Quem sabe lhe
ajudem!
1. Se você
quer reinventar o seu trabalho, você precisa SE reinventar. Parta sempre de si
mesmo e não dos outros. O movimento é de dentro para fora e não o contrário.
2. Tenha
consciência de que o século XX acabou de acabar, e desculpe a redundância. Se,
como afirmou o historiador britânico Eric Hobsbawm, o século XIX só acabou após
a Primeira Guerra Mundial (1914-1918), podemos afirmar que a pandemia da COVID-19 decreta,
agora sim, o final do século XX. É a tal diferença entre o tempo cronológico e
o tempo histórico. O século da tecnologia e dos avanços científicos termina,
assim, de forma um tanto quanto melancólica.
3. Entenda
que a pandemia está funcionando como um acelerador de mudanças e antecipador de
novos cenários. Não acredita? Tendências que levariam meses, talvez anos, para
acontecer, estão chegando sob pressão. Olhe ao redor: home office,
tempo disponível em casa, relação familiar mais intensa, sustentabilidade e
crise ambiental, educação a distância, transporte de massa, crise sanitária e
uma nova ordem geopolítica mundial, são alguns dos assuntos que vêm se impondo.
Já pensou nisso e nas suas implicações?
4. A partir dessa constatação,
perceba que novos cenários já emergem e devem acabar se impondo no mundo
pós-pandemia. A educação não está alheia a esse movimento. Mais ainda, é um
segmento claramente sensível a essa mudança de cenários. A pergunta é: você
está consciente disso e com espírito e ânimo de se preparar
para esses novos cenários e seus desafios? Fique firme, pois a tarefa é ingente
e revigoradora ao mesmo tempo.
5. Talvez,
na sua volta ao trabalho, a instituição escolar na qual você exerce como
professor não lhe pareça mais a mesma. Não importa quantos anos faz que você
trabalha nela. Dificuldades econômicas, de gestão, de relação com
as famílias, de credibilidade e outras, podem tê-la afetado. Talvez paire no ar
uma certa angústia e desorientação diante dos novos cenários e rumos da
educação. Preste atenção nisso e seja positivo e colaborador com ela. O momento
é de comprometimento.
6.
Prepare-se para receber estudantes que passaram por experiências marcantes,
estressantes e diferenciadas. Tipo “geração coronials”. Não se
apavore se chegam com outras perguntas, outros pressupostos, valores e formas
de ver a vida. Assuma que a sua relação será, daqui pra frente e
preferencialmente, professor-aluno mais do que professor-turma.
7. Não se
esqueça das famílias dos estudantes. Com certeza, você terá
famílias marcadas por experiências diversas. Algumas, fragilizadas por terem
perdido entes queridos, o emprego ou o negócio, por relações familiares
conturbadas, enfim. Outras, fortalecidas pelo convívio familiar sadio, pela
recuperação da intimidade do lar, pelo aproveitamento do tempo e o crescimento
comum e pessoal. Fique atento, é fundamental entender esse cenário e a possível
influência nos estudantes.
8. É o seu
propósito que vai comandar a sua vida e o seu trabalho. Troque,
aqui e agora, o objetivo pelo propósito. Saiba com clareza o que você quer,
aonde você quer chegar e qual o caminho a ser percorrido. Isso lhe ajudará
muito e, com certeza, passará firmeza e convicção aos seus educandos. Não
esqueça, e prepare-se, da importância que você vai ter como mentor educacional
presencial (ou virtual).
9. O
planejamento passará a ser mais fundamental do que nunca. Tudo bem que
brasileiro não liga muito para “por que” e “para que” e vai logo querendo saber
“como”, mas, daqui para frente, o conteúdo e o planejamento vão
comandar. Entenda, conteúdo não é conteudismo e sim cerne, fundamento da
questão, o que importa. Metodologias ativas não vão funcionar em “currículo
velho”. Lute para mudar isso, fique atento e prepare-se, pois tudo parece
apontar para a preponderância do ensino híbrido, ao menos na educação básica.
10. Se você era, ou ainda é,
resistente à tecnologia, entenda: não há volta. Aproveite e mergulhe, busque
novos conhecimentos e mantenha-se em processo de contínuo aprendizado. Não
queira ficar na idade da caneta, mas, também, não esqueça que você não é um
Youtuber e sim um professor, um profissional da educação e tenha orgulho
disso. Tecnologia e EAD vieram para ficar!
11. Trabalhe
em equipe. Mova-se coletivamente, seja rápido, compartilhe o saber
e as iniciativas e dê o melhor de si para os colegas.
12. Não seja
excessivamente otimista, mas mantenha uma esperança ativa, que não o deixe cair
na desespero, no ceticismo ou na falta de ilusão. Valores como
resiliência, solidariedade e empatia sairão
fortalecidos e passarão a valer muito. Pratique-os sempre!
E no mais,
coragem, saúde e paz. Apesar de tudo, são bons tempos! Reinvente-se!
Francisco
Morales foi diretor-geral do Colégio Santo
Agostinho-BH
durante 20 anos. Atualmente, é diretor
pedagógico
do Grupo Educacional Vereda.