A pandemia da Covid-19 consolidou a China como
adversária dos EUA, havendo o risco de esta relação subir um degrau e as duas
nações se tornarem inimigas. É um processo que encerra um período no qual as
maiores economias do planeta tiveram uma convivência de parceria mutuamente
benéfica e rivalidade relativamente saudável. Poderiam ter estreitado o bom
relacionamento bilateral ou agravado a competição. A segunda opção é a que saiu
vitoriosa neste período de Donald Trump e Xi Jinping.
Antes de prosseguir, vale explicar as diferenças
entre rival, adversário e inimigo. Rival é algo alguém com quem se compete, sem
necessariamente haver inimizade. Os EUA e a China competem, por exemplo, para
ampliar mercados para seus produtos. Duas pessoas ou dois países podem ser
rivais na profissão e amigos na vida pessoal. Adversário, no entanto, é quando
duas nações se posicionam de forma antagônica em um ou vários temas. Elas se
tornam inimigas quando qualquer relação de parceria começa a ser abandonada e o
risco de confronto aumenta.
A China chegou a ser inimiga dos EUA na época de
Mao, até Richard Nixon iniciar a aproximação entre os dois países em 1972. A
inimizade foi deixada de lado. Seguiram como adversários em algumas questões,
mas não como rivais. Os EUA eram claramente superiores economicamente,
geopoliticamente e militarmente. Para entender melhor com outros exemplos, a
União Soviética foi rival, adversária e inimiga dos EUA. Já o Irã, nunca chegou
a ser um rival. Desde a Revolução Islâmica, é um adversário em questões do
Oriente Médio e inimigo. O mesmo valia para o Iraque de Saddam Hussein e vale
para a Coreia do Norte.
Nas últimas duas décadas, a China se tornou um
rival econômico dos americanos, se tornando o maior parceiro comercial de uma
série de nações, incluindo o Brasil. Ao mesmo tempo, mantinha uma parceira
grande no comércio bilateral com os EUA. Geopoliticamente, havia atritos e
discordâncias em alguns temas na Ásia e mesmo no Oriente Médio, como na Guerra
da Síria. Mas nada que pudesse descrever os dois países como adversários.
Com a chegada de Trump ao poder e a guerra
comercial, a rivalidade começou a rumar para uma relação de adversários. Os
discursos de ambas as partes passaram a ser agressivos. Com a pandemia da
Covid-19, passou até conotações preconceituosas. Primeiro, com o presidente
Trump usando o termo “vírus chinês” para se referir ao novo coronavírus e ao
culpar a China pela pandemia. Membros do regime de Pequim, por sua vez,
difundiram uma conspiração culpando os americanos pela doença. Além disso,
houve enorme falta de transparência da China no início do contágio.
A rivalidade, que era clara na questão do 5G,
transformou agora os rivais em adversários e estamos diante do risco de
passarem a ser inimigos. Caso este cenário se configure nos próximos meses ou
anos, a instabilidade geopolítica global, que já é enorme, pode atingir níveis
quase insustentáveis. Dentro da sociedade americana, ao menos em alguns
setores, os “chineses” já superaram os jihadistas, ou “radicais islâmicos”,
como a imagem do inimigo americano. Se na Segunda Guerra Mundial a imagem do
“mal” era a de japoneses e alemães, na Guerra Fria a União Soviética e na
Guerra ao Terror a Al Qaeda, Estado Islâmico e Irã, nesta nova era será a
China.
CHINA X EUA