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domingo, 19 de outubro de 2025

Tomáz Antônio Gonzaga - Marília de Dirceu.

Casa de Tomás Antônio Gonzaga -Rua Cláudio Manoel, 61 - Centro, A construção do século XVIII, em estilo colonial, é a casa na qual residiu o poeta Tomás Antônio Gonzaga – inconfidente das Minas Gerais – entre os anos de 1782 a 1788, quando se tornou ponto de encontro dos líderes da Inconfidência Mineira. Gonzaga é autor de uma das mais conhecidas histórias de amor da literatura quando, utilizando o pseudônimo Dirceu, escreveu belos e famosos poemas para sua musa inspiradora Maria Dorotéia, conhecida como Marília de Dirceu, alcunha que dá título à obra.Hoje o imóvel abriga a sede da Secretaria Municipal de Turismo Indústria e Comércio de Ouro Preto, além de exposições temporárias. O gramado nos fundos da casa é objeto de um cuidado excepcional e sua localização proporciona uma bela panorâmica do Pico do Itacolomi. No quintal, o visitante encontra também um tanque que era utilizado pelos escravos.

Tomás Antônio Gonzaga nasceu em Portugal, na cidade do Porto, em 11 de agosto de 1744, e morreu em Moçambique, em 1810. A mãe, Tomásia Isabel Clarque, era portuguesa e morreu quando o poeta ainda era bebê. O pai, João Bernardo Gonzaga, era um advogado brasileiro que voltou para o país natal por conta de sua nomeação a ouvidor-geral de Pernambuco quando Tomás tinha 7 anos.

Aos 17 anos, Gonzaga voltou a Portugal e estudou Direito em Coimbra. Ele tentou uma cadeira na Universidade, por meio da apresentação da tese Tratado de Direito Natural. Até 1781, exerceu a função de juiz de fora em Beja, cidade portuguesa. Foi no ano seguinte que retornou ao Brasil para ser Ouvidor-geral em Vila Rica, Minas Gerais.

O luso-brasileiro Gonzaga não imaginou que seu nome e o da sua amada se tornariam eternos com esse retorno à terra de sua infância. Foi durante o tempo em que esteve no Brasil que se apaixonou por Maria Doroteia Joaquina de Seixas e aprimorou sua poesia (com o fundador do Arcadismo no Brasil, o poeta Cláudio Manuel da Costa), e assim criou em Marília de Dirceu uma espécie de "Romeu e Julieta" brasileiro, que veio a se tornar o conjunto de poemas líricos mais renomado da literatura em língua portuguesa.

Porém, não só de glórias viveu o poeta-ouvidor nessa estada. Envolveu-se com a política local e ganhou inimigos por conta de sua profissão. Também é considerado autor da obra satírica Cartas chilenas, que ironizava o governador Luís da Cunha Menezes, inimizade de Gonzaga. Além disso, foi denunciada à Coroa Portuguesa uma conspiração urdida por um grupo de ilustres habitantes de Vila Rica, do qual faziam parte Cláudio Manuel da Costa, Tomás Antônio Gonzaga e Joaquim José da Silva Xavier, o Tiradentes. Os conspiradores foram presos e o caso ficou conhecido como Inconfidência Mineira. Gonzaga escreveu a segunda parte de Marília de Dirceu no cárcere. Apenas Tiradentes recebeu a pena capital. Os demais inconfidentes foram deportados. O poeta foi degredado para Moçambique. Lá se casou com Juliana de Sousa Mascarenhas, com quem teve um casal de filhos, e viveu até sua morte, em 1810. Diz-se que não escreveu mais poemas no exílio. Contudo, consta na Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro um poema épico manuscrito atribuído a Tomás Antônio Gonzaga. Com o título de A Conceição, foi escrito em Moçambique, por volta de 1800, e narra o naufrágio do navio Marialva, mas está incompleto. Apenas mais uma curiosidade do célebre poeta que ajudou a consolidar a literatura brasileira com uma triste história de amor.

Texto e contexto

Marília de Dirceu é um longo poema lírico dividido em três partes. A primeira é constituída de 33 liras e foi escrita antes da prisão do autor. A segunda tem 38 liras e é posterior ao aprisionamento do poeta. É nela que Gonzaga mostra toda sua força lírica sem se preocupar tanto com as convenções árcades. A terceira traz 9 liras e 13 sonetos dirigidos a outras "musas".

É curioso destacar que a primeira parte traz a prisão e seus elementos como metáfora para o amor. Na segunda parte, a figura de linguagem torna-se literal: o eu lírico (e o autor) é de fato prisioneiro em uma masmorra.

Além de importância histórica, Marília de Dirceu tem boa qualidade estética e fez com que o criador fosse considerado o melhor poeta árcade do Brasil. Tomás Antônio Gonzaga trouxe sopro de novidade para a poesia do Arcadismo brasileiro, instituído por Cláudio Manuel da Costa. Gonzaga obedecia às características dessa escola literária, como a exaltação de uma vida mais natural, a adoção de um pseudónimo latino ou grego de pastor (nesse caso, Dirceu), a utilização de versos simples, em contrapartida ao rebuscamento do Barroco, e o emprego da mitologia grega. Porém, o poeta não tinha um conteúdo impessoal, pelo contrário, sua vida pessoal foi combustível potente para seus versos. Marília era a jovem Maria Doroteia Joaquina de Seixas, sua namorada e posteriormente noiva. Moça de família influente de Vila Rica, ela era a personagem perfeita para um amor idealizado e difícil. Os familiares da donzela eram contrários ao relacionamento com um homem bem mais velho e com menos posses do que ela.

Uma feliz conjunção de fatores fez ser possível o sucesso editorial desta obra no Brasil. O ouvidor português culto travou conhecimento com o generoso e experiente poeta Cláudio Manuel da Costa. Costa acolheu Gonzaga incentivando-o e orientando-o na empreitada literária. Eles tornaram-se amigos chegados e Costa foi referido na obra-prima do amigo. Glauceste é o pseudónimo árcade do mestre. Na mesma época, Gonzaga elegeu Maria Doroteia como musa ideal de seus amores. A eleita também ganhou um pseudônimo: a imortal Marília que será de Dirceu para todo o sempre, à revelia da realidade.

Marília de Dirceu tem mais força nas duas primeiras partes, mas o ápice de sua lírica está na segunda parte, escrita após a prisão do poeta. Gonzaga continuou se referindo à vida pastoril para manter a coerência, mas o cerne do poema passou a ser o sentimento de injustiça, a saudade da amada que não poderia mais ver e alguma esperança de concretizar os planos anteriores. Gonzaga faz o leitor sentir também toda a indignação de um aprisionamento que ele considera injusto, especialmente na Lira II dessa segunda parte.

Tome nota

Segundo Antonio Candido, ter como amigo Cláudio Manuel da Costa e namorar Maria Doroteia Joaquina de Seixas foi o que deu potência à obra de Tomás Antônio Gonzaga: a junção da técnica e do amor. O homem de meia-idade que chegou ao Brasil em 1782 só havia escrito uma tese e poemas esparsos não publicados. Gonzaga então conheceu o pioneiro do Arcadismo brasileiro, que enxergou o potencial lírico do discípulo e o guiou para o sucesso. Para completar o quadro, encontrou ainda uma linda jovem que correspondia ao seu interesse. O poeta conseguiu o melhor de dois mundos, pelo menos até a prisão. Mesmo com a queda do paraíso, a dor não enfraqueceu o bardo, pelo contrário, parece que o fortaleceu ainda mais. Isso, como diria o próprio Gonzaga: "Graças, Marília bela, graças à minha Estrela!" (Parte I, Lira I) .

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