Bullying

terça-feira, 31 de dezembro de 2019

É bem melhor um perfil original do que uma virada fake. Feliz 2020!...










Obra do artista francês Cyril Rolando, que faz arte exclusivamente digital, usando o pseudônimo de AquaSixio.

Existir é sempre viver a mistura de  dois sentimentos básicos: alegria e dor.  Estamos marcados pelo compasso desses dois movimentos. Em alguns momentos eles se mesclam, em outros um prevalece mais que o outro. O maior desejo das pessoas é de que todas as nossas vivências humanas fossem repletas somente de alegrias. Mas isso é completamente impossível. Ah se pudéssemos congelar os momentos mais prazerosos da nossa vida e também das pessoas que amamos! Como seria bom! Imagine fixar no topo da existência os seus momentos de maior gozo ficando eternamente ali? Alegria e dor nunca chegam pra gente isolados um do outro. Nos nossos momentos mais alegres, encontramos pontos tristes. Sempre quando estamos vivenciando bons momentos nos chegam pensamentos impactadores. Parece que vem nos lembrar que existe dor nesta vida e que nela também, na dor gente,  encontramos iluminações grandiosas. A dor da gente é dor de vida, de amor e de ser humano que somos. Incrível, mas tem momento que o que nos salva é a dor. Todos já sabem disso. Há momentos de travessias muito dolorosas na nossa vida que nos transpõe mais fortalecidos. Há sempre uma emoção diferente nos chamando para ver a outra dimensão das coisas e dos fatos que nos afetam. Schopenhauer, conhecido como o filósofo do pessimismo já disse que a nossa referência de felicidade está referenciada nos momentos em que nos sentimos infelizes. Todos os dias se repetem a vivência de situações mais inusitadas e jamais imaginadas por nós. As ansiedades que nos consomem chegam marcadas pela mistura desta binaridade: dor e alegria. Neste momento, quantas pessoas estão vivendo um luto e quantas estão nascendo trazendo a celebração da vida. Um velório e uma festa convivem harmonicamente nos seus contextos indicando como  a vida é sempre composta de tudo, como dizia minha mãe. O final de ano está cheio de acasos, de alegrias,  de viagens, praias e festas.   Um carro sai de casa para buscar mais alegria ainda e  pode retornar repleto de dor. 
No último dia de 2019, da minha janela, vislumbro o mesmo cenário de sempre: árvores verdíssimas, carros de boi que passam com seus sons de motores quebrando o silêncio, completando esta paisagem, um mormaço sufocante. É a paisagem de pecuária da cidade vazia, que aparece um gado aqui e outro lá, neste final de 2019. Só parece, muita gente “escolhe” virar o ano aqui mesmo. A oportunidade leva gente para a virada para as praias que alimentam mais a um ilusão infinita. Pessoas caminham pela rua  fazendo planos para 2020. Quantos planos de 2019 foram abandonados e quantos agora são retomados? Dezenas deles, sequer iniciados.
Na rede o que mais se vê são fotos de família, legendadas por alegrias, situações e vivências coletivas que parecem dissipar e afastar a consciência das nossas dores sociais: desemprego, ódio, preconceitos e desentendimentos difíceis de serem superados. As ilusões que se avistam na passagem de 2019 para 2020 são motivadas por um jeito mágico de pensar a vida. Será que em 2020 não tem jeito de cairmos  na existência prática da vida? Aproxima-se a segunda década do século XXI, que inicia em 2021, final dos anos 20,  uma geração que tem o pé no século XX e no milênio passado e outro no XXI e ainda não aprendemos. Não aprendemos porque é assim mesmo, de acordo com Schopenhauer vemos cada vez mais distorcidas a realidade. Caminhamos sempre para o fundo desta caverna que é o mundo.  Impossível alcançar a iluminação. Mas você olha com imensa gratidão tudo de 2019, e ainda está tudo por resolver, nada está pronto, as alegrias sociais ainda estão por serem feitas. Um tempo de coisas terminam para iniciar outro. Mas parece que para as situações de exclusão o tempo nunca termina. As coisas não se resolvem e 2020 chega com mais questões somadas aquelas que ainda nem sequer foram colocadas nos planos governamentais: saúde, educação, meio ambiente.
Lya Luft disse em um de seus textos que "falta alegria em nossas vidas". Disse que não paramos de reclamar, e que temos muitas vezes razão. Olha a lista das aflições como é grande: os impostos, o custo de vida, o desemprego, a violência, a súbita falsidade de alguém em quem confiávamos tanto, a pouca autoridade das autoridades, a nossa própria indecisão. As rápidas mudanças na sociedade, alguns ainda tentando arrastar o cadáver dos valores que precisam ser mudados, ufa...
De nada adianta estas constatações... se estacionarmos nelas pura e simplesmente. É preciso acordar todos os dias a esperança,  renovar a fé e  a disposição para ir em busca do horizonte que foi deixado para traz, porque outros já se sobrepõem. Os sonhos mais fundamentais que impulsionam a humanidade não encontraram ainda as condições necessárias e suficientes para acontecer. Assim segue a existência na eterna busca do que ainda nem se apropriou. De nada adianta se acomodar enquanto a vibração do mundo não cessa. O pouco movimento das coisas é apenas aparente e nem surpreende pois tem algo pulsando silenciosamente. Quem enxerga para além do que vê, sente este compasso do seu território sintonizado com uma história muito maior.  Não é uma virada de 31 de dezembro capaz de mudar a historia.  Ele é somente o último dia do ano! A virada não muda você, sua cidade e seu país. Isto é mais um fake bem tênue que se cria para encobrir evidências.
Tem muito de fake neste 31 de dezembro. Tantas mágicas que se faz, retirando do fato, do prático, do real as pessoas. As coisas não caem do céu. Tudo é resultado de investimento da energia que temos e do direcionamento que damos. Projeta 100%, se coloque de corpo e alma para lograr talvez 10%. Outro fake do 31 de dezembro, que todo mundo faz, para falar em dinheiro é a mega da virada. Onde? Como? Uma chance em 50 milhões para 49 milhões que jogam na ilusão deste grande fakesonho. O maior desafio da vida está é em nós mesmos.  Será que o lugar para onde temos que ir é sempre ontem? Da mesma forma? Carregando as mesmas pesadas visões da vida, do mundo, das coisas? 
Os propósitos da virada são esquecidos e se perdem no cotidiano do novo ano. O que vai nos fazer avançar, pessoal e coletivamente, é o saber, a ciência,  a reflexão, apesar  da anticiência,  do antisaber e da antireflexão. Um entendimento dos fatos deste momento da história, articulada com sonhos que até podem parecer ingênuos, mas são superimportantes para nos fazer caminhar.  Articular com a realidade e pensar a existência,  é viver sem ser manada. Janelas e portas se abrem ao pensamento e a gente sente que é possível mudar a história de dor do mundo. Do contrário viveremos a eterna ilusão fake da virada, validando como natural e normal as situações mais injustas e desiguais que um ser humano pode viver neste mundo. Não é exemplar discriminar alguém pela sua imagem, pela sua cor, pelo seu jeito de ser, por não ter dinheiro, por não ter estudado, por ser índio, por ser negro, por ser... ser...  Vejo que estamos enclausurados pelas fakes da virada, presos em uma cosmovisão retrógrada,  sem nos darmos conta desta teia envenenante que nos tece negativamente sem deixar ver o que seria a verdadeira virada. Aquela que verdadeiramente precisamos fazer. A virada verdadeira será feita de  muitas utopias. Para virar as situações que provocam as dores no mundo é imprescindível fantasiar, olhar no horizonte, vislumbrar inventividades  e caminhar com os  pés no chão da nossa triste história. O combustível da vida é a alegria ainda que  a dor seja sempre uma sombra a nos acompanhar. O mormaço do dia é belo, porque o sol de verão da praia invade e ilumina o nosso coração, porque a cidade em que vivemos é o melhor lugar do mundo para se viver, porque... porque... são infinitos os motivos que tornam as coisas belas por elas mesmas.  Vinicius de Morais já cantou: "Alegria é a melhor coisa que existe, é assim como a luz no coração." Alegria por podermos presenciar mais esta virada de 2019 para 2020 e entender que o tempo e a história da nossa vida, do nosso território, do nosso país, só mudam se lutarmos por sonhos verdadeiros. Chega de sonhos fake, virada fake, notícias fake. Eu quero a verdade que liberta. Aquela que está no Evangelho de João 8:32 que diz: " E conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará".

Parafraseando Chalita digo que as palavras a serem ditas no ano novo, traduzam a verdade da gente, não as nossas fakes. Convido a todos para cultuar compaixão e respeito e abandonar a palavra perversidade. Que nos esforcemos para não causarmos dor no outro com falsas verdades, preconceitos e humilhações. Ao outro já basta a cota de dor que lhe é devida neste mundo. Somente no amor nos tornamos capazes de sermos verdadeiros mutuamente e fazer a virada truth que o nosso mundo tanto precisa
                                    Feliz 2020!
                 Por Deodato Gomes Costa

Um comentário:

Juelice da costa coutinho disse...

Caro amigo, você tocou num ponto mto importante da nossa vida. Todos os anos carregamos nas costas as nossas angústias, medos, aflições. Somos bombardeados com tantas informações. Exigem se de nós posturas, trabalhos, correrias, cobranças, e em troca um salário que com muito custo conseguimos sobreviver. E aí vem o final de ano trazendo a beleza e a magia do natal dos homens. Nós revestimos de vários tons para recebermos os amigos, parentes, convidados... Logo a seguir vem a virada com promessas, lindos cartões, mensagens que nos fazem por uns instantes sonhar que haverá uma virada. Mas no dia seguinte percebemos que a virada era fake. E daí? Já gastamos muito. E a verdadeira virada não aconteceu. E agora? Esperar por um novo ano que transcorre seguindo as mesmas mazelas. E compreendemos que nada é mágico. Vamos colocar os pés no chão, a mão na massa, porque a virada só acontece se partir de dentro de você.