Uma noite onde a Quarta-Feira foi Azul¹
Na NOITE desta quarta-feira,
19 de agosto de 2025, o sol havia completado seu poente em Carlos Chagas quando
nós, da Comissão de AEE da Secretaria de Educação, seguimos rumo ao SICOOB
Hall, em Nanuque em um daqueles amarelinhos. O destino não era uma simples sala de formação; era mais um
capítulo do nosso aprendizado coletivo sobre algo que atravessa não apenas as
escolas, mas também as nossas memórias e emoções mais íntimas: o Autismo.
À frente de tudo, como sempre, estava a psicóloga Patrícia Rodrigues, com sua clareza firme e, ao mesmo tempo, acolhedora. Ao redor dela, palavras técnicas ganham vida, teorias encontram exemplos, e conceitos que poderiam soar frios nos livros se tornam carne e afeto. Patrícia não fala de autismo como quem descreve um diagnóstico. Ela fala de gente. E quando fala de gente, cada um de nós inevitavelmente se lembra de um aluno, de um filho, de alguém próximo da gente. Vi muito de Maria em tudo que foi ensinado.
Presenças que contam
histórias
Estávamos ali: Maria,
supervisora incansável; Rita Medrado, psicóloga de sensibilidade atenta; Joice,
nossa assistente social sempre de mãos dadas com as famílias; e eu, Deodato,
Secretário de Educação que insiste em aprender para não se perder no caminho da
gestão. Encontramos também Rejane, professora da Escola Municipal Oscar João
Kretli, que se juntou a nós nesse mergulho de reflexões.
Na estrada de ida e volta,
partilhamos não apenas o carro, mas também histórias, dúvidas, expectativas. É
assim que a formação também acontece: no movimento, no diálogo, nos olhares
cúmplices.
Patrícia e sua psicologia de
afetos
Patrícia nos conduziu pelos
Fundamentos do Transtorno do Espectro Autista (TEA). Explicou que o TEA é um
espectro – e espectro é arco-íris, é diversidade, é multiplicidade. Não há um
autismo único, mas milhares de modos de ser autista. Falou do diagnóstico
precoce, possível desde os 18 meses, quando sinais sutis como a falta de
contato visual ou estereotipias motoras aparecem.
Trouxe o DSM-5 e a CID-11,
mas com eles não vieram códigos frios, e sim as portas para compreendermos que
cada aluno precisa de apoios diferentes. Três níveis de suporte, dizia ela, que
na prática se traduzem em um compromisso maior da escola em não deixar ninguém
para trás.
Da teoria ao chão da escola
Falamos de critérios
diagnósticos: dificuldades na interação social, interesses restritos, rotinas
rígidas. Mas também falamos de vida real: a criança que tampa os ouvidos porque
a sala é barulhenta demais, o aluno que prefere girar o carrinho a brincar de
corrida, a menina que recusa o prato do dia porque a textura não combina com
sua sensibilidade.
As imagens que Patrícia
projetava ganhavam voz nas nossas lembranças:
– “Ah, esse comportamento é
igualzinho ao do meu aluno”, murmurava alguém.
– “Essa seletividade
alimentar é o que a mãe da fulana tanto comenta”, dizia outro.
Dicas que não cabem só no
quadro
Patrícia nos lembrou de
algo precioso: na escola, pequenas atitudes mudam mundos. Usar recursos visuais
para apoiar a comunicação. Respeitar o tempo da criança e manter a rotina
previsível. Estimular a interação sem forçar, mediando encontros. Evitar
punições por estereotipias, porque nem todo bater de mãos é birra – às vezes, é
apenas o corpo pedindo equilíbrio.
E, acima de tudo, reduzir
os excessos de estímulos. Afinal, se até nós, adultos, sofremos com uma sala
barulhenta ou uma luz forte demais, por que não aceitar que o autista sinta
isso de forma ainda mais intensa?
Desmontando mitos
Entre tantas verdades, foi
preciso também derrubar algumas mentiras persistentes: não, pessoas com autismo
não são incapazes de sentir emoções. Não, o autismo não é causado por vacinas.
Nem todo autista é um gênio das exatas ou da música. E não, o autismo não tem
cura – porque não é doença. É jeito de ser.
Epílogo de uma noite!
Saímos do SICOOB Hall
diferentes. Não porque aprendemos algo novo apenas, mas porque fomos lembrados
de algo essencial: educar é um exercício de humanidade. Patrícia nos ajudou a
perceber que, diante do autismo, não basta conhecimento técnico; é preciso
também humildade, paciência e amorosidade.
Na volta, enquanto o carro
percorria a MGC-418, pensei: talvez a maior lição que o autismo nos dá é que
cada um tem seu tempo, sua forma de ser, seu modo de estar no mundo. E que cabe
a nós, educadores, abrir caminhos para que todos possam florescer em sua
singularidade.
Quanto mais compreendermos
e colocarmos em prática o conhecimento, mais poderemos fazer pelos autistas,
que tanto nos ensinam sobre o verdadeiro sentido de ser humano.
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