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sexta-feira, 24 de abril de 2020

Doença afeta múltiplos órgãos - O Globo de 24 de Abril de 2020 - A HORA DA CIÊNCIA Patricia Rocco


Ter foco é ter objetivo, estabelecer um planejamento, ter persistência para atingir as metas e alcançar o que se pretende. Assim tem que ser o combate à Covid-19, doença que afeta não só o pulmão, mas também outros órgãos.
Será que estamos realmente focados em vencer essa guerra contra a Covid-19? Será que o médico não está focando somente na melhora dos sintomas respiratórios acarretados pelo Sars-CoV-2 (vírus responsável pela Covid-19), esquecendo que diversos outros órgãos podem estar acometidos e levar a óbito? O pulmão realmente é o órgão mais afetado pela Covid-19, e pacientes podem evoluir com insuficiência respiratória aguda, necessidade de intubação traqueal e ventilação mecânica.
Será que estabelecemos um planejamento correto? Vários ventiladores mecânicos foram comprados, consertados, e outros fabricados no Brasil. Entretanto, por que temos sempre a sensação de estar enxugando gelo? Pacientes continuam morrendo, já que a estrutura hospitalar não se baseia somente no ventilador mecânico, temos que ter o médico para “pilotá-los”. Quando se pensa em ventilação mecânica, não há um piloto automático, e o risco de ela acarretar lesão não só ao pulmão, como também a cérebro, coração e rim é muito grande.
Além do ventilador mecânico, o vírus, por si só, pode também lesar os sistemas nervoso central e periférico. Acredita-se que o vírus se espalha do epitélio olfatório para o cérebro causando a perda do olfato (anosmia) e paladar (ageusia). Recentes estudos também sugerem que a infecção viral pode levar a alterações de coagulação e induzir acidente vascular cerebral (AVC) isquêmico ou hemorrágico, o que também contribui para o óbito.
O Sars-CoV-2 tem outro órgão alvo, o rim. Cerca de 20% dos pacientes internados nas Unidades de Terapia Intensiva evoluem com insuficiência renal aguda, sendo que 10% necessitam de diálise. O coração também pode ser afetado pelo Sars-CoV-2. O vírus pode infectar o músculo cardíaco na proporção de 1 a cada 5 pacientes, levando a insuficiência cardíaca e morte, mesmo naqueles sem sinais de insuficiência respiratória.
A forma como o médico olha seu paciente, principalmente na fase inicial da doença, talvez tenha que mudar. Voltando novamente para a importância do foco, todos os órgãos precisam ser examinados, e estratégias terapêuticas desenvolvidas, não somente para a melhora da lesão pulmonar, mas do cérebro, rim e coração. Em suma, temos que ter planejamento.
Não adianta possuirmos leitos, ventiladores e médicos, sem métodos dialíticos e terapias para eventos tromboembólicos. Além de tudo, há que ter persistência para atingir as metas e alcançar o que se pretende. Não é nada fácil estarmos nadando diariamente contra a maré, seja por problemas logísticos, financeiros e/ou estruturais hospitalares. Temos que alcançar o nosso objetivo: a cura da Covid-19.

A forma como o médico olha seu paciente, principalmente na fase inicial da doença, talvez tenha que mudar

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